D. Fernando Paiva, a convite do Bispo de Leiria-Fátima preside às celebrações do 12 e 13 de Setembro, no Santuário de Fátima.
Aqui deixo algumas fotos e as homilias proferidas nos dias 12 e 13 de Setembro.
Homilia de 12 de Setembro de 2024
Santo Nome de Maria
(A importância do nome nas relações humanas)
Estamos nesta noite, neste Santuário para expressar a nossa devoção a Nossa Senhora, bendizendo e invocando o seu nome santo, o nome da Mãe do Céu, Maria, a sempre Virgem Maria.
Ser chamado e chamar alguém pelo nome é mais do que uma simples formalidade: é um reconhecimento da individualidade e existência de cada pessoa. No contexto das relações humanas, chamar alguém pelo nome estabelece uma ligação pessoal, demonstrando respeito, atenção e empatia.
Ao tratarmos alguém pelo nome próprio estamos a reconhecer a sua presença e importância. Ser chamado pelo nome reforça o sentido de pertença e validação.
(A importância do nome nos textos bíblicos e na nossa relação com Deus)
Começo por esta introdução porque as leituras que acabamos de escutar são as da Missa do Santo nome de Maria e daí esta primeira reflexão acerca do nome, e da sua importância no âmbito das relações interpessoais. No contexto bíblico os nomes têm grande importância pelo menos por duas razões:
– por um lado pelo seu significado, ou seja, cada nome é revelador da própria identidade do personagem bíblico, e em alguns casos, o assumir uma missão como que configura uma nova identidade, e por isso um nome novo, é o caso de Abrão, que passa a ser Abraão e Simão que passa a ser Pedro, Petrus, a pedra a partir da qual Jesus quis edificar a Sua Igreja.
– por outro lado, pelo caracter eminentemente pessoal que é próprio, que é específico, da relação que Deus quer estabelecer com todos e com cada um. Assim, em várias passagens da Sagrada Escritura os personagens bíblicos são identificados nominalmente, Deus chama-os pelo seu próprio nome. Recordemos Adão, (Gen, 3, 99); Abraão (Gen, 22,11); Moisés (Êx. 3,4); Samuel (1º Samuel, 3, 10); Jacob (1 Sam3, 10); Elias (Reis19;9,13); Saulo/Paulo Act. 9,4)
No relato da Anunciação, que acabámos de escutar, todos os personagens são identificados pelo seu próprio nome, há uma referência muito explicita ao nome de cada um:
– O anjo não é referido de forma anónima, é-nos dito o seu nome, Gabriel, o Arcanjo Gabriel
– diz-nos o texto bíblico, “o nome da Virgem era Maria”, desposada com um homem de quem é referido o nome, José
– A Maria é dito especificamente o nome que deverá dar ao seu Filho, Jesus, que significa “O Senhor salva” ou “O Senhor é Salvação”
Também a relação de cada um de nós com Deus é pessoal e personalizada. Deste modo, entramos na família dos filhos de Deus pelo Baptismo e ninguém é baptizado sem ser mencionado explicitamente o seu nome. É assim também noutros sacramentos, nomeadamente no Santo Crisma, no Matrimónio e na Ordem.
Somos chamados a colaborar na edificação de comunidades de fé viva, onde as pessoas, onde os irmãos se conhecem pelo nome. O anonimato não é próprio de uma comunidade, de uma família. Por isso, faço um apelo aos pastores, aos religiosos e aos leigos a promoverem de forma activa e diligente a edificação de comunidades mais fraternas e personalizadas, onde cada um se sinta acolhido e respeitado.
Nesta noite invocamos com particular devoção o nome de Maria, este nome bendito que nos encanta, que nos atrai e que nos fez vir esta noite a este encontro, neste Santuário para nos aconchegarmos no regaço desta boa Mãe que nos consola, que nos protege e que tanto nos ensina.
(O que Maria nos ensina)
No Magnificat, a Virgem Maria ensina-nos a alegrarmo-nos no Senhor e a cultivar uma profunda atitude de gratidão. O cântico de Maria, que hoje rezámos cantando o salmo responsorial é um hino de louvor e reconhecimento das maravilhas que Deus realizou na sua vida e no mundo. Maria exalta a grandeza de Deus e reconhece humildemente o seu favor: “A minha alma glorifica o Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador.” Ela mostra-nos que a verdadeira alegria brota da intimidade com Deus e que a gratidão é a resposta natural ao Seu amor e misericórdia
Na Anunciação, Maria ensina-nos a inteligência, a pertinência e a legitimidade da pergunta que procura compreender e a sabedoria de quem confia em Deus, mesmo
naquilo que não consegue entender. Quando o Anjo Gabriel lhe anuncia que será a mãe do Filho de Deus, Maria não aceita passivamente, mas questiona com humildade: “Como será isso, se eu não conheço homem?” A sua pergunta revela uma mente ativa e desejosa de compreender, mas também uma fé que não vacila perante o mistério. Maria mostra-nos que é legítimo procurar entender os planos de Deus, mas que a confiança n’Ele deve prevalecer, mesmo quando não conseguimos entender tudo. O seu “Eis a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra” é um ato de fé absoluta e entrega total, que nos ensina a confiar em Deus e a abraçar o Seu plano, mesmo quando ultrapassa o nosso entendimento.
Maria, através do Magnificat e da Anunciação, é para nós um modelo de alegria no Senhor, gratidão, busca inteligente da verdade e sabedoria que confia. Ela convida-nos a viver com o coração aberto a Deus, a agradecer sempre, a perguntar com sinceridade e a confiar plenamente na bondade e fidelidade de Deus.
(A Mensagem de 13 de Setembro)
Estamos hoje na vigília do 107º (centésimo sétimo) aniversário da 5ª aparição de Nª Srª aos santos Pastorinhos e neste mesmo local onde nos encontramos, esta nossa boa Mãe veio-nos ensinar uma outra dimensão e esta também tão importante na nossa vida de discípulos do Seu Filho, na nossa vida de cristãos e ser cristão – este belo nome, pelo qual somos conhecidos, exprime a nossa identidade e também uma pertença, porque pertencemos ao Senhor, quer vivamos, quer morramos, como nos ensina S. Paulo, na Carta aos Romanos.
Nesta 5ª aparição, no dia13 de Setembro de 1917, a Senhora do Rosário pede a perseverança na oração, especialmente a oração do Rosário, do Terço, como forma de alcançar a paz e o fim da guerra, neste tempo que estamos a viver, lembramos tantos irmãos nossos que vivem a angústia do sofrimento provocado pela guerra, na Terra Santa, na Ucrânia e noutros locais. Nesta noite, unidos em Igreja, rezamos por esta intenção que a Mãe do Céu nos recomenda.
Que a Virgem Maria, Senhora do Rosário de Fátima, no seu amor de Mãe, a todos proteja e guarde.
✠ Fernando Paiva, Bispo de Beja
Homília, 13 de Setembro 2024
A Virgem Maria, Amparo da Fé
(O desejo de felicidade que trazemos no coração)
Diz-nos Jesus “Mais felizes são os que ouvem a Palavra de Deus e a põem em prática”
Estas palavras de Jesus têm por pressuposto que existe no coração de cada homem um desejo de ser feliz e de procurar a felicidade. Mas de onde vem este desejo de felicidade?
A fonte do desejo de felicidade é o próprio Deus, que criou o ser humano com este desejo profundo e universal inscrito no seu coração. Este anseio de felicidade é, na verdade, uma busca de Deus, que é a única realidade capaz de satisfazer plenamente o coração humano. Deus colocou no coração do homem o desejo de felicidade para o orientar na procura pelo bem supremo, que é Ele próprio. Este desejo é, portanto, inato e faz parte da condição humana, sendo um reflexo do facto de termos sido criados à imagem e semelhança de Deus (CIC, 27). O desejo de felicidade é um dom de Deus, refletindo o Seu chamamento para que o homem O busque e O encontre, pois só em Deus a felicidade pode ser plenamente realizada.
Mas estas palavras de Jesus também nos mostram que ouvir a Palavra de Deus de forma autêntica, acolhendo-a verdadeiramente como Palavra divina e colocando-a em prática nas nossas vidas, é um caminho seguro e certo para responder e corresponder ao anseio de felicidade que trazemos no mais íntimo do nosso ser
(Maria)
E ninguém como Maria, ouviu, acolheu e pôs em prática na sua vida, em toda a sua vida a palavra de Deus. Quando diz sim ao convite que Deus lhe fez através do Arcanjo Gabriel, “Faça-se em Mim segundo a Tua Palavra”, como ainda ontem à noite ouvimos neste mesmo Santuário, na proclamação do Evangelho, Maria como que sintetiza tudo o que foi e é a sua vida. O acolhimento da Palavra de Deus, a obediência à Sua vontade, estiveram sempre presentes na vida de Maria e por isso a sua vida é bem-aventurada, feliz, como lhe diz a sua prima Santa Isabel “feliz daquela que acreditou que teriam cumprimento as coisas que lhe foram ditas da parte do Senhor”. A vivência
autêntica da Fé (embora nem sempre nos traga maior bem-estar) faz-nos mais felizes e faz mais felizes os que vivem à nossa volta.
(Maria, Amparo da fé)
Assim, a Virgem Maria é para nós Amparo da Fé:
Pelo seu exemplo de fé pura e perseverante. A vida de Maria é marcada por momentos de provação, desde a fuga para o Egipto até a crucificação de Jesus. A sua perseverança diante das adversidades inspira-nos a mantermos a fé também nos momentos mais difíceis.
Maria é também intercessora poderosa junto a Deus. Ela é chamada de “Mãe da Igreja” e “Mãe dos crentes”, e podemos sempre contar com a sua intercessão nos momentos de necessidade espiritual e material, a intercessão de uma mãe amorosa que cuida de seus filhos. Mas Nossa Senhora convida-nos também, também a nós à oração e em especial à oração de intercessão. Faz hoje 107 anos, a Senhora do Rosário pediu a perseverança na oração e especialmente a oração do Rosário, do Terço, como forma de alcançar a paz e o fim da guerra. Também neste tempo que estamos a viver, lembramos tantos irmãos nossos que vivem a angústia do sofrimento provocado pela guerra, na Terra Santa, na Ucrânia e noutros locais. Neste dia, unidos em Igreja, também nós rezamos por esta intenção que a Mãe do Céu nos recomenda.
Maria é também Fonte de Consolação e Esperança e por isso é invocada como “Consoladora dos Aflitos” e “Refúgio dos Pecadores”. Nos momentos de dor e sofrimento, recorremos a Maria em busca de conforto e esperança, sabendo que ela, como boa Mãe e pela sua própria experiência de sofrimento e fidelidade, compreende as nossas angústias.
Em Fátima, Maria aparece como aquela que nos conforta e anima, que nos convida à conversão e à oração, amparando-nos nos momentos de dificuldade e incerteza. Ela é a estrela que ilumina o nosso caminho, amparando a nossa fé e encorajando-nos a confiar sempre no amor de Deus.
(A Fé dos Pastorinhos de Fátima)
Os Pastorinhos de Fátima, Lúcia, S. Francisco e S. Jacinta, são um exemplo luminoso de uma fé pura e corajosa, sustentada pelo amor a Nossa Senhora. Desde muito novos, enfrentaram provações e desafios, mas mantiveram sempre a confiança em Deus e nas palavras da Senhora. A sua fé simples, mas inabalável, torna-se também para nós um amparo espiritual; ao contemplarmos a vida destes pequenos pastores,
encontramos o estímulo necessário para também nós perseverarmos na fé, mesmo quando a vida se apresenta difícil. A fé dos Pastorinhos é um como que espelho que nos reflete a grandeza da confiança em Deus e na Sua misericórdia.
Aos Pastorinhos foi concedida a graça de saborear as alegrias do Céu, de contemplar a beleza da Santíssima Virgem e começaram a amar Jesus e Maria mais do que tudo, preferiram guardar o que receberam de Deus – o seu segredo – à sua própria vida. Foi esta alegria, este entrever a felicidade do Céu que ficou profundamente enraizado nos corações destas crianças e que lhes deu força para se sacrificarem e receberem todos os sofrimentos que vieram a acolher com tanto amor, com tanta abnegação. As lágrimas amargas que derramaram à beira do poço foram, no fundo, lágrimas de amor
(Os Encontros que Amparam a Nossa Fé: A Amizade na Aventura da Fé)
Mas o nosso caminho de fé é também ajudado, amparado pelos encontros pessoais e pelas amizades que cultivamos ao longo do caminho. Amigos verdadeiros são um amparo fundamental, partilhando as alegrias e os desafios da vida, e ajudando-nos a crescer na fé. Os Pastorinhos de Fátima também nos ensinam a importância da amizade no caminho da fé. A cumplicidade e a união entre Lúcia, Francisco e Jacinta mostram-nos como a fé é fortalecida quando vivida em comunidade, quando partilhada e sustentada pela amizade sincera. Eles ampararam-se mutuamente nas dificuldades e nas dúvidas, incentivaram-se a rezar, a confiar, e a seguir o caminho que Nossa Senhora lhes indicava. Esta amizade exemplar torna-se um modelo para nós: a fé não é uma aventura solitária, mas um caminho feito em companhia, onde a presença de amigos que partilham connosco a mesma fé e a mesma esperança é uma ajuda preciosa. A amizade é, pois, um lugar privilegiado de crescimento espiritual, onde somos amparados, consolados e encorajados.
(Conclusão)
A fé é um dom precioso que precisa de ser constantemente alimentado e cuidado. Viemos aqui hoje, a este Santuário, a esta celebração porque temos fé, mas também viemos para que a nossa fé seja fortalecida e purificada. Maria é o grande amparo da fé porque nos oferece um exemplo concreto de como viver plenamente a fé em Deus, intercede por nós nas nossas necessidades e oferece-nos consolo e esperança nas nossas tribulações. Ao longo desta peregrinação que é a nossa vida podemos sempre contar também com o amparo da fé que são para nós os Santos e aqui em Fátima
lembramos os Santos Pastorinhos e ainda todos os que, ao nosso lado, fazem caminho na aventura da fé.
Que o amparo de Maria e a intercessão dos Santos Pastorinhos nos alcancem o dom da paz e nos fortaleçam na fé, na esperança e na caridade
✠ Fernando Paiva, Bispo de Beja