Aquele que é a luz do mundo, o Senhor da vida e da morte, vem ao nosso encontro, vem ao teu encontro nesta Páscoa, querido irmão ou irmã, e convida-te para a verdadeira liberdade e para o banquete da sabedoria, para o banquete da Nova Aliança: todos vós que tendes sede, vinde à nascente das águas (Is. 55,1); Vinde comer do meu pão, bebei do vinho que preparei para vós (cf. Prov. 9,5).
Sem Páscoa não há futuro
Meus queridos diocesanos e amigos:
1 – Anunciar a Páscoa neste nosso contexto, convidar pessoas para celebrarem a Morte e a Ressurreição de Jesus de modo a poderem saciar-se nas fontes da vida e da salvação é quase como tentar vender roupas de verão no pino do inverno ou apregoar chapéus-de-chuva no deserto, onde não chove. Atualmente, a maior parte das pessoas sente-se bem no Egito, como se estivesse na sua pátria. Não quer ouvir falar de ressurreição, e de morte, ainda menos. Sair do Egito? Isso era antigamente. Porque deixou de ser visto como casa da escravidão, o Egito está agora muito mais sedutor que a melhor idealização da Terra Prometida, e o caminho faz-se agora em sentido inverso. Basta ver as multidões que deixam para trás Jerusalém e o Sinai e trocam Jesus e Moisés pelas idolatrias de sempre e pelas superstições de novo reabilitadas.
Os tempos são outros. O faraó é o mesmo de sempre e não mudaram os seus desígnios sinistros, mas agora usa métodos mais sofisticados e eficazes: trocou o rigor do chicote pelo conforto, a fome e o racionamento pela abundância de bens materiais e disfarça a mesma dura servidão e manipulação dos escravos oferecendo-lhes, de bandeja, as mais amplas liberdades individuais. Em nome dos superlativos direitos do indivíduo, o faraó já não mata só os meninos mas nega o direito à vida também às meninas. E, para garantir o bem-estar do momento presente que engorda esta geração para a matança, incentiva-lhe o egoísmo, a gula, a luxúria e a esterilidade, e assim destrói a família e inviabiliza o futuro. Nunca dantes se viu no mundo algo comparável a este Egito deslumbrante, a esta terra da abundância e de todas as liberdades, a este magnífico Eldorado. Assim, quem se disporia a sair do Egito para se ver livre de um faraó tão bom? Não vale mais um pássaro na mão que dois a voar? Alguém trocaria o seu conforto e as suas seguranças por uma deriva cheia de perigos num deserto onde não há nada, em busca de uma hipotética terra prometida? Apenas aqueles que, como Moisés, têm sabedoria para discernir o presente e vislumbrar o futuro, como se vissem o invisível (Cf. Heb.11,27). De facto, estas liberalidades faraónicas são um engodo e sumamente precárias, mas as pessoas, anestesiadas, não dão por isso. Não reparam nos muitos sinais de desagregação do tecido social, nem avaliam os custos criminosos e as consequências desastrosas desta embriaguez coletiva. Para que haja futuro precisamos da Páscoa.
2 – Nesta sociedade, parece que Deus sobra. Pior: os falsos profetas demonstram facilmente aos incautos, com duas mentiras, que Deus é nosso inimigo e nos rouba o espaço de que precisamos para sermos nós próprios. Deus quer? Não! O homem quer, o homem sonha, a obra nasce e, pelo homem, cresce e é concluída. Do homem que a sonha ao que dela frui, do homem para o homem, em circuito fechado, em curto-circuito. E o homem agradece a si mesmo e ao seu trabalho, e a si próprio se felicita. Quem conseguirá fazer-lhe ver que precisa de um Redentor, se a superficialidade e a soberba o cegam e impedem de se conhecer a si mesmo? Voltado completamente para fora, para dominar e transformar o mundo, o homem ocidental vendeu a alma ao diabo por um prato de lentilhas. Perdeu a interioridade, ficou completamente analfabeto no que respeita à vida espiritual e vê-se enredado nas superstições mais grosseiras e nas mais pesadas idolatrias.
Quem abrirá os olhos a esta geração para que se dê conta da destruição provocada pelo materialismo e pela estupidificação crescente de tanta gente que, tendo abandonado a fé cristã parece contentar-se com uma vida sem dignidade e sem esperança? Quem escutará a voz persistente do seu coração inquieto, criado para Deus e sempre insatisfeito enquanto não descansa n’Ele? Quem abrirá o caminho do Êxodo a esta geração surda, cega e paralítica que apodrece miseravelmente neste sofisticado Egito disfarçado de terra prometida?
3 – Aquele que é a luz do mundo, o Senhor da vida e da morte, vem ao nosso encontro, vem ao teu encontro nesta Páscoa, querido irmão ou irmã, e convida-te para a verdadeira liberdade e para o banquete da sabedoria, para o banquete da Nova Aliança: todos vós que tendes sede, vinde à nascente das águas (Is. 55,1); Vinde comer do meu pão, bebei do vinho que preparei para vós (cf. Prov. 9,5).
Como vosso pastor que sou, traduzo e concretizo para vós este convite: Vinde celebrar a Páscoa! Vinde aclamar Cristo nosso Rei e Senhor na procissão do domingo de Ramos! Vinde, na quinta-feira santa, inaugurar o Tríduo Pascal e viver intensamente a entrega de Jesus por nós e aprender a praticar a verdadeira caridade fraterna em profunda humildade, servindo os irmãos com os mesmos sentimentos de Jesus. Vinde, na sexta-feira santa, contemplar a Paixão do Senhor na qual resplandece o amor imenso de Deus para connosco e também as consequências do pecado do mundo, dos nossos pecados. Vinde adorar o Senhor crucificado e aprender a sabedoria da Cruz. Na noite de Páscoa, na solene Vigília Pascal, a mais importante de todas as celebrações, vinde passar com Cristo da morte para a Vida; vinde refontalizar a vossa vida cristã renovando as promessas do Batismo e celebrando o memorial da Páscoa do Senhor, a Eucaristia, na qual recebemos, como penhor da Vida Eterna, o corpo do Senhor Jesus Ressuscitado!
4 – Não digas que não tens tempo. Dá importância ao que é importante. Sê inteligente, não inventes desculpas, sê bom para ti mesmo! Vem celebrar a Páscoa connosco e poderás dizer com os discípulos de Emaús: o Senhor ressuscitou verdadeiramente (Luc. 24,34)! E poderás testemunhar, com Maria Madalena: vi o Senhor (Jo.20,18)!
Queridos irmãos e amigos: sem Páscoa não há vida, não há futuro! Manifestemos a alegria incomparável de sermos filhos de Deus regenerados por Cristo no seio da Igreja, de sermos membros do Corpo de Cristo, reis e sacerdotes! Rezemos uns pelos outros para que, nestas celebrações, recebamos abundantemente o Espírito Santo para anunciarmos corajosamente a vitória de Cristo sobre a morte. Ele vos conceda, nestas festas, a sua paz e a sua alegria!